Quão grande é seu Jesus?
Depois de três anos e 36 blogs, estou iniciando uma pausa na escrita de artigos para o blog Planetwise, e me parece apropriado concluir esta série sobre eco-heróis bíblicos com Jesus. Escrevi antes sobre a falsa percepção de que Jesus ignorou o cuidado com a criação (veja em inglês). Mencionei que seu ensino usou metáforas da natureza por toda parte, que no coração do Pai Nosso estava uma visão da encarnação terrena do Reino de Deus (Mateus 6:10), e que a grande comissão que ele deu a seus seguidores incluía pregar as boas novas ‘a toda criatura’ (Marcos 16:15, ARC). Outros solicitamente comentaram em meu blog assinalando a continuidade de Jesus com os ensinos do Antigo Testamento sobre o cuidado da criação, e que embora ele não pudesse ter abordado o atual contexto de ecocídio, seus ensinamentos condenaram a ganância e materialismo que constituem a base da cultura de hoje (por exemplo, Lucas 6:20–26).
Tudo isso é útil, mas refletindo mais a respeito percebi que falhei em abordar as questões mais importantes de todas. Quem era Jesus e qual era sua missão na Terra? Acredito que individualizamos tanto Jesus que o reduzimos a um salvador pessoal portátil: ‘Meu Cristo, Salvador’ – linda canção, mas perigosa doutrina com seu pronome possessivo e foco. Então, vamos dar um passo atrás e nos perguntar quem Jesus era e é em relação a toda a ordem criada…
Primeiramente, Jesus era o ‘novo Adão’ (1 Coríntios 15:22; Romanos 5:1–18). Isso não apenas implica que a vida, morte e ressurreição de Cristo deram a possibilidade de um novo começo para toda a raça humana, mas também o liga a Adão (e portanto a toda a humanidade) como feito a partir do adamah – o solo ou a terra. Como James Jones assinalou [1], Jesus era o novo filho da terra (o Filho do Homem/Adão), quebrando a maldição que o pecado de Adão colocou sobre a terra (Gênesis 3:17). Além disso, no nascimento de Jesus como bebê humano, a criação material é reafirmada. Significativamente, o evangelho de João fala de Jesus, o Verbo, tornando-se ‘carne’ (sarx, João 1:14), deliberadamente escolhendo um termo que carrega em si todos os animais, e não apenas ‘seres humanos’ (anthropos). No nascimento de Jesus, aquele através do qual e para o qual todo o universo foi feito (Colossenses 1:15–16; João 1:1–3) torna-se uma minúscula e vulnerável parte da criação, e naquele momento a nova criação começa. Na encarnação de Jesus uma semente é plantada que torna um novo início possível, não apenas para nós, seres humanos, em nosso relacionamento com Deus, mas para toda a ordem criada.
Em segundo lugar, Jesus era e é o ‘Salvador do mundo’ (João 4:42; 1 João 4:14). Enquanto os samaritanos que primeiro usaram estas palavras estavam provavelmente celebrando o fato de que Jesus veio para os gentios assim como para os judeus, e enquanto «Deus amou o mundo de tal maneira» em João 3:16 parece ter o contexto imediato do mundo da sociedade humana, ambos os versos usam ‘cosmos’ para mundo – uma palavra que tanto no grego clássico quanto no grego do Novo Testamento significa a mesma coisa que hoje: tudo o que existe na criação. O evangelho de João é um texto teologicamente sofisticado e ele sabia exatamente o que estava implicando. João 1 conscientemente começa com as mesmas palavras que Gênesis 1, mostrando que Jesus, o Verbo, é uma figura cósmica – o Criador (João 1:3) – que também trás luz ao mundo, tanto física quanto espiritualmente. Em outro momento, Paulo afirma categoricamente que Jesus é aquele por meio do qual Deus se agradou de «reconciliar consigo todas as coisas, tanto as que estão na terra quanto as que estão nos céus, estabelecendo a paz por seu sangue derramado na cruz» (Colossenses 1:20). Assim, todas aquelas canções e sermões que falam de Jesus vindo ‘para mim’ e ‘para nós’ (embora corretamente enfatizando o quão pessoalmente Deus nos ama) correm o perigo de reduzir Jesus ao nosso tamanho. Jesus veio para morrer e ressuscitar para realizar todo o grande projeto de Deus de criação e nova criação. Cada vale e montanha, cada pássaro e árvore, cada nação e cada pessoa é parte do porquê Jesus veio ao mundo.
Em terceiro e último lugar, Jesus é o futuro da criação. De acordo com a carta de Paulo aos Efésios (1:9–10), o grande plano de Deus – o mistério no coração do universo – é «fazer convergir em Cristo todas as coisas, celestiais ou terrenas». Muito frequentemente, nossa meta como cristãos tem sido pequena demais. Sim, nossa missão inclui pregar o evangelho, fazer discípulos, cuidar do pobre, procurar a justiça, promover a paz, mas nenhum destes é nosso alvo último. Todas estas são peças de um quebra-cabeças maior: a renovação de toda a criação em Cristo. Este é o objetivo da missão de Deus, o quadro geral que devemos ter em mente em todas as nossas atividades e prioridades. Segue-se que uma ‘missão’ que danifica o planeta, prejudica o pobre ou falha em abordar as necessidades espirituais das pessoas é, na melhor das hipóteses, incompleta, e na pior, falso evangelho. A criação anseia pela libertação da escravidão da decadência, e é a missão da Igreja articular e auxiliar nessa libertação. A Bíblia não poderia ser mais clara: «a natureza criada aguarda, com grande expectativa, que os filhos de Deus sejam revelados» (Romanos 8:19–21).
Então, no alvorecer de um Novo Ano, com enorme potencial para bem ou mal, para a libertação da criação da destruição alimentada por combustíveis fósseis e para ação possibilitando «tudo o que tem vida» a louvar ao Senhor (Salmo 150:6), que Jesus vamos seguir? Vamos reduzir Jesus a uma apólice de seguro eterna portátil ou um cobertor de conforto espiritual, ou vamos adorar o Senhor de toda a criação e buscar seu senhorio em nossos estilos de vida, nosso voto, nossas prioridades e nossa relação com cada parte de seu maravilhoso, ferido mundo?
[1] Jones, James. Jesus e a terra: A ética ambiental nos Evangelhos. Viçosa, MG: Ultimato. (Veja http://www.ultimato.com.br/loja/produtos/jesus-e-a-terra)
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