1 outubro 2024 | Rui Ramalho | 0 comentários

Lágrimas de Deus: o maior desastre ambiental

Desde miúdo que a água, em todos os seus estados e aparições, sempre me fascinou. Ao crescer, fui percebendo que, apesar de fascinante, não passa de um recurso material finito, que tanto pode pender para a vida, como para a morte. Por outro lado, fui descobrindo um novo fascínio: a água enquanto recurso espiritual infinito. A água que só pende para a vida. No Algarve, região onde brotou o primeiro projecto d’A Rocha, há 41 anos, a água é cada vez mais escassa. Só que Cristo continua a inundar-nos e florir-nos de esperança. 

Um mar profundo coberto de escuridão e o Espírito a pairar sobre as águas. É assim que Génesis descreve o universo ainda antes da Criação. A água esteve sempre lá. Foi sinónimo de fecundidade e abundância para Adão e Eva, de condenação para os contemporâneos de Noé, de arrependimento e transformação para João Baptista no Jordão. Na mesma água em que Jesus caminhou, Pedro afundou. O mesmo mar que se abriu para Moisés fechou-se para Faraó. Ao nascer do ventre de Maria, Jesus perfurou as águas do saco amniótico. Ao ser perfurado pela lança do soldado romano, Jesus escorreu sangue e água. Vida. E morte. O pomar da Cruzinha, primeiro centro de estudos e comunidade d’A Rocha, é um espelho desta dicotomia. 

A severa seca que tem assolado o Algarve na última década já fez sucumbir várias das nossas árvores de fruto (enquanto isso, os extensos relvados dos campos de golfe da região invejariam até os jardins de Versalhes). Em Abril, altura da última chuva digna de registo neste ano, plantámos novas árvores. Em junho, alegrámo-nos por saber que, pela primeira vez em 3 anos, ser-nos-ia disponibilizada alguma da (pouca) água acumulada na barragem mais próxima. Com ela, enchemos os lagos artificiais, a cisterna, voltámos a regar o pomar e a vida voltou. Aves, anfíbios, mamíferos, insectos (incluindo os mal-amados mosquitos). Todos vieram pela mesma razão. Se vai durar para sempre? Provavelmente, não. Afinal, a água que corre pelos tubos do nosso sistema de rega é apenas do tipo “recurso material finito”. Quem bebe desta água, como diria Jesus, “voltará a ter sede”. Felizmente, existe também uma água do tipo “recurso espiritual infinito”: “Mas quem beber da água que eu lhe der, nunca mais terá sede, porque a água que eu lhe der torna-se dentro dessa pessoa numa fonte que dá a vida eterna” (João 4:13-14).  

Vou dizer algo que pode soar polémico, mas, por favor, acompanhem graciosamente o meu raciocínio. O profeta Zacarias (10:1) diz-nos que é o Senhor quem envia a chuva aos homens. Por esta ordem de ideias, quando não há chuva é porque Deus não a está a enviar. Acredito que, se Ele escolhe não o fazer, é para que o ser humano entenda que a sua nefasta e egoísta gestão do planeta implica consequências. Ainda assim, a abundância ou falta de água serão sempre uma decisão Dele. A escassez hídrica não é o problema. O problema é que Deus está triste. O mundo não vai acabar por falta de água. Nem nós vamos salvar o mundo porque somos exímios a poupar água (é bom que o sejamos!). Deus está triste porque nós só estamos interessados em matar a nossa sede física.  

A dor de um planeta ferido e à beira da destruição é passageira e a cura já está garantida. O mundo não vai acabar por falta de água. Nem nós vamos salvar o mundo porque somos exímios a poupar água (é bom que o sejamos!).È deus que salva, não nós. O profeta Zacarias (10:1) diz-nos que é o Senhor quem envia a chuva aos homens. Deus está triste porque nós só estamos interessados em matar a nossa sede física. Como mordomos da Criação, temos o dever de contar ao mundo que há um rio de água viva que as circunstâncias terrenas não podem secar. A segunda vinda de Cristo a este planeta é o maior e mais importante acto ecológico de todos. 

Claro que isso não nos deve levar a uma atitude de negligência, preguiça ou alienação face a essa ferida. Temos de aprender a cuidar do planeta com urgência e, simultaneamente, com serenidade. De cada vez que cuidamos do planeta, estamos a dizer ao mundo que o mundo não acaba aqui. De cada vez que cuidamos do planeta, estamos a dizer ao mundo que há um lugar onde a água nunca mais acabará – e sim, um pedacinho desse lugar já pode (e deve!) ser experimentado aqui, na Terra. Poupar água não vai resolver o problema da escassez de água. Poupar água é uma gota de esperança aspergida sobre o mundo. Evitar o consumo de plástico é outra gota de esperança. Escolher produtos orgânicos e locais é outra. Reduzir a pegada de carbono é outra. Por todo o mundo, A Rocha vai continuar a aspergir estas e outras gotas de esperança. Até ao dia em que o Senhor da chuva virá resolver o problema por completo. 

Eu quero beber da outra água e tornar-me numa fonte de vida eterna onde outros bebem. Foi por isso que aceitei o desafio de dirigir este centro de estudos ambientais, Cruzinha. Bebam comigo e brindemos! 


Rui Lino-Ramalho 

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